Casal brasileiro recupera antigo apartamento de Fernando Pessoa e aluga por temporada
Em uma busca despretensiosa por imóveis no centro histórico de Lisboa, um casal de brasileiros encontrou um pra lá de especial: um apartamento onde Fernando Pessoa viveu na juventude, em 1905 e 1906.
“Sem muito destaque, no meio do anúncio, havia a informação de que naquele apartamento havia morado Fernando Pessoa. Fiquei impressionada e muito curiosa, mas isso não interferiu na negociação [a autenticidade da residência já havia sido atestada pela Câmara de Lisboa ao proprietário anterior]. O apartamento não custou nem um centavo a mais por ele ter vivido ali”, conta Maria Penido, proprietária de uma empresa que auxilia estrangeiros de mudança para Portugal.
Ela e o marido, o publicitário Ricardo Braga, já estavam em busca de um imóvel para investir no segmento de aluguéis por temporada para turistas. Com a descoberta do ilustre morador, Ricardo logo se animou em fazer algo dedicado à obra do poeta.
“Eu queria mais do que simplesmente pôr uns livros e umas fotos do Fernando Pessoa na parede. Queria algo que refletisse o período em que ele viveu aqui”, conta.
“Entrei em contato com a equipe da Casa Fernando Pessoa, fui atrás de especialistas, li muita coisa. Fiz uma imersão total”, conta Ricardo.
Nina, a filha mais nova do casal, confirma o entusiasmo dos pais.
“Meu pai agora está sempre lendo alguma coisa de Fernando Pessoa em casa”, diverte-se ela.
Volta às raízes
O momento em que Pessoa viveu no apartamento, um segundo andar na rua de São Bento, marca o reencontro do poeta com sua terra natal.
Nascido em Lisboa em 1888, ele perdeu o pai quando ainda era pequeno. Fernando Pessoa acabou se mudando para a África do Sul com apenas 7 anos acompanhando sua mãe, que casara com o cônsul de Portugal naquele país.
Após ter feito todos os seus estudos em inglês, Pessoa regressa a Lisboa com 17 anos, para cursar Letras na Universidade de Lisboa —curso que ele viria a abandonar no segundo ano.
É nesta casa, onde viveu com a tia e outros parentes, que Pessoa começa resgatar a portugalidade.
Com a consultoria de dois estudiosos da obra do poeta, António Cardiello e Fabrizio Boscaglia, o casal decidiu incluir várias referências ao período na decoração da casa.
Nas paredes, há vários manuscritos obtidos junto à Biblioteca Nacional de Portugal que mostram que Fernando Pessoa ainda usava predominantemente a língua inglesa em seus apontamentos.
Embora seja um dos maiores poetas da lusofonia, apenas um dos quatro livros que publicou em vida (“Mensagem” ) foi escrito na língua de Camões. Os demais estavam em inglês.
O apartamento
“Quisemos fazer um espaço aconchegante, que tivesse uma atmosfera antiga, mas ao mesmo tempo aconchegante e atual”, conta a empresária Maria Penido, que cuidou pessoalmente da decoração.
Foram horas de busca na internet e na Feira da Ladra —famoso mercado de antiguidades de Lisboa, presente inclusive na obra de Fernando Pessoa— atrás de objetos que remetessem ao poeta.
Com dois quartos, sala de estar, sala de jantar e um banheiro, a casa acomoda quatro viajantes.
Desde o lançamento, em esquema de soft opening há menos de um mês, a procura tem sido grande.
Ironicamente, a primeira hóspede, uma americana do Texas, não fazia ideia de quem era o poeta. Chegou atraída pela luminosidade e pela localização privilegiada da casa, que fica na rua de São Bento, próxima à Assembleia da República.
“Quando eu vi que era uma americana, fiz questão de deixar uma coletânea de poemas de Fernando Pessoa em inglês na cabeceira da cama. Uma semana depois, quando ela foi embora, me mostrou que havia comprado dois livros dele para levar para casa. Fiquei muito feliz!”, conta a empresária.
Além do apartamento em si, Ricardo Braga resolveu ainda criar experiências personalizadas relacionadas ao universo do poeta.
É possível agendar um tour com os pesquisadores ou mesmo marcar um colóquio para aprender mais sobre a vida e a obra do escritor.
Na semana passada, o pesquisador Jerónimo Pizarro, uma das maiores autoridades no estudo do poeta, visitou o apartamento e se disse encantado com o que viu.
“Há outros apartamentos em que Fernando Pessoa viveu disponíveis no AirBnB em Lisboa, mas nenhum teve tamanho cuidado”, contou Pizarro, enquanto fitava, com um sorriso no canto dos olhos, para a mesa de centro da casa, onde estava um de seus livros sobre o poeta.
Mais Pessoa
Para ter uma experiência pessoana em Lisboa, no entanto, não é preciso ir ao AirBnB. Há diversas referências ao poeta espalhadas pelo centro da capital portuguesa.
No Chiado, o café A Brasileira tem a famosa estátua de bronze dedicada e ele. Na região de Campo de Ourique, é possível a casa em que ele viveu seus últimos 15 anos, hoje transformada em fundação.
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